domingo, 23 de fevereiro de 2014

Todas as saudades

Não tirava o homem e seu nome da cabeça, há uns três anos, a paixão já pesava e trazia a angústia que torna o ar rarefeito, tirando o sono ao deitar os olhos no micro das micro ondas. Mais uma parte daqueles inúmeros dias que o coração quer sair do peito, e não tardava passar do esquerdo para o lado direito. E foi numa tarde justa, após ter ido ao salão fazer a unha e o pé, ali mesmo no bairro do Tatuapé, assim que saiu do shopping, que avistou um menino cinza, quieto, escondido entre as escadas da rodoviária, sentado como um monge sobre o cobertor rocamboleado, que ninguém percebia, a não ser a sorte de um olhar também angustiado.
Parou para ver até que seu olhos se tocassem e foi se aproximando até puxar assunto, com a delicadeza e o medo de não arrebentar nada. Não era habituada a falar com estranhos e a remota ideia de conversar com alguém daquela afiguração, nunca passou pelo seu pensamento.

- Posso falar com você?
- Pode.
- Você já almoçou?
- Sim. Comi já tem umas três horas.
Atrapalhada insiste:
- Você mora onde?
- Moça, eu moro na rua.
- Cadê seus pais?
- Morreram bêbados.
Algumas outras coisas ditas, muito pessoais ficarão em segredo,
e ele pergunta o nome estendendo
a mão para cumprimentá-la e assim se apresentam.
Ele diz seu nome, o mesmo nome do famigerado que corroía seu peito por dentro.
O garoto magro que ao se levantar se fez enormemente bonito, mesmo sem os dois dentes da frente,
beijou a mão da senhora em agradecimento.
Ele trazia metade da sua idade, e chorando foi encolhendo,
do um e noventa ao um e setenta,
e quando chegaram na mesma altura, ela lhe pediu um abraço,
que apertado, ajustado no encardido de um peito perfumado,
levou embora na despedida dos olhos molhados, todas as saudades.

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