quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Esconderijo

No desespero, se escondeu na escuridão da igreja, não sabia de rezas, mas carecia de um lugar invisível, menos luminoso que a praça, a sala de aula e a pressa. Chegou correndo, cabeça baixa e sentou no banco. Do lado direito, um vitral exagerava no azul de causar dor nos olhos tristes. Fechou os olhos, apertou as mãozinhas, uma contra a outra. Não sabia o que era ser criança sem aquela mãe que sumia toda tarde, e sem a mão do pai embebido que sacudia os filhos pelos cabelos em gritaria. Entendia esse amor ungido nas dores que uniam os quatro irmãos, untados uns pelos outros, besuntados em desespero, tardes e noites, quando não estavam na escola, e perdiam a tão esperada merenda. Mas naquela manhã, não haveria mais tardes e noites condoídas para Amparo e seus três irmãos pequenos. Na igreja, escondida, pensava que ganharia tempo, encontraria uma saída. A saída chegou vestida de senhora. A mulher encontrou escondida uma penumbra miúda que não sabia rezar, mas sabia abraçar e apertar que nem gente grande aquelas seis mãozinhas. Os alunos viram quando foram levados embora. Surpresos, sem nunca terem entrado num carro, ao contrário das tantas vezes que abaixavam a cabeça envergonhados na sala de aula, os meninos acenavam na certeza que iriam voltar. Amparo, mordendo os lábios, segurava o choro para não assustar os meninos, pois sabia que agora teriam que morar sem os pais que tanto amavam, num abrigo.    

A foto de Giovana Araújo inspirou este conto.

2 comentários:

  1. Ah, um pequeno conto. O que a autora terá observado?...

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  2. Vou colocar a foto, Eduardo! Boa lembrança! Foi a imagem que inspirou o conto, muito grata!

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