domingo, 30 de dezembro de 2012

Rota dos pássaros

Há sempre um pássaro que
ao iniciar do voo, com os seus
fala com as nuvens:
-Como é lindo esse céu!
Até a volta! Adeus!

A possibilidade de não ter.

A possibilidade de não ter é grave apenas no tom da voz.
A possibilidade de não ter é imensa, alimenta,
inspira e muda todas as rotas.

Então comemoro a possibilidade de não ter.

A possibilidade de não ter enche as ventas.
A possibilidade de não ter, não se abre mão,
nos cobre de honrarias, nos ilumina,
e o que é melhor, é grátis, nos deixa sem culpa ou redenção.

A possibilidade de não ter, a gente inventa e deita em cima.
Inerente a possibilidade de viver ou morrer.

A possibilidade de não ter,

é ser.

sábado, 29 de dezembro de 2012

Amor e palhaçada, palhaçada do amor.

O palhaço para a palhaça, num picadeiro montado na praça:
-O que o amor tem a ver com o humor?
Abrindo e fechando os olhinhos, um montão de vezes,
reverenciando a resposta dela.
-Não sei amor, você me faz tanta pirraça! Não sei se isso é amor! 

Descabelando, eis que a palhaça arregaça.
Os tambores rufaram para o palhaço simular um descontrole do peito, 

prendendo a boca com um pregador de varal, implora pelos olhos
da amada, e num quase desmaio não programado, congela diante da plateia. 
Mas é ela quem desata:
- Que aconteceu? Engoliu a fala, dessa deixa que você não esperava, 

mas quem errou? Me fala?
Descongelando, esquece o palhaço em casa, solta os lábios presos

 e confessa num sussurro ouvido por todos:
-Você me quebrou as pernas amor...Contou para o respeitável público, 

como é que a gente faz amor!

Maira Garcia




sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Por quase nada

Sua postura me carregou na primeira braçada.
Me apaixonei tão rápido, e por quase nada.
Me aventurei sozinha, em lugares insistentes por visitas,
que nunca chegam.
Me retirei, chorei, dei vistas e vistos.
Depois sorri, como quem recebe,
e perde o amor, no maior improviso.

Como fazer uva passa

Desejar a uva, a intenção é sua.
Então a fruta aquece, amadurece e cai.
O sumo assim se aquece, e a uva passa.

Maira Garcia

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Quer café, louro?

O papagaio aprendeu a dizer:
-Quer café, louro?
Repetia com exaustão a frase, que ninguém mais achava graça na casa.
Aí um dia ele disse:
-Quer cachaça, louro?
O pessoal gostou da ideia tosca do louro, e como eram fracos na bebida, dormiram bebinhos na mesa.
E foi assim que o papagaio "Pinga ne mim", nunca mais foi visto por aí.

Maira Garcia


terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Passageiros

As cabines que ainda navegamos,
usamos, sem precisar, o código morse.
Lá fora, o capitão, interrompeu a transmissão e mandou avisar:
-Atenção senhores tripulantes, haja a tempestade que houver,
mantenham a calma. Todos temos um norte!

Maira Garcia


segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Adeus, Platão.

Algo se aproxima,
anunciando o fim
de uma era de cisma.
...

Vem vindo, plainando,
e cairá
sem explodir, nem pesar.
Subirá em dia de siesta,
correrá, escadas encaracoladas,
ajeitando fenestra.
Ficará, ao lado, dobrado,
coberto, soberbo, nadando,
em caldas de mil fios,
e algumas que restarem
vão tocar seresta nesse rio.

Pelas arestas, dedos
cerram cortinas,
sem ceras, tão claras.

Buzinas e luzes os guiam,
anunciando o findar do medo,
sem escaras.

Não concedendo mais platonices e segredos,
Ao invés, enlevam, concedem
bamboleiam, bombeiam,
a chique-chiquear,
chiqueando até cansar.

Baião, um, dois,
panos de sim,
feijão com arroz.
Farão duos, e quando
desfeitos, satisfeitos
serão festim.





domingo, 23 de dezembro de 2012

A dor de um segundo não é dor

O mundo cai duas vezes,
em cima de quem é forte,
resistir ao peso é oportunidade,
azar ou sorte.
De tão forte,
Um anjo te carregou da primeira vez,
pra não sentir dor,
E aí já era,
a maldade nessa hora,

 pensa que consegue, mas erra.

Mas dor sentiu quem ouviu, viu
e lembrou do sorriso na voz,
do sonho de locutor.
Das antenas,
a tristeza de ser transmitido pelo Datena.

Pra lembrar que nosso mundo,
 há vários mundos,
da barbárie,
das trevas de verdade,
 e da luz que faz caminho aqui pra te levar pra bem longe,
do chão do submundo.que se abriu para si.

Lá pra onde você foi,
não se conhece abatimento,
carro no chão,
atropelamento
Levantar, aceno, aceno de mãos.

O socorro é outro, chega pleno, sempre em forma de oração.

Para Pedrinho,
que sorrir nos fazia acreditar sorrindo,
mas para ir embora,
deixaram que ele fosse embora
de carona para o céu, dormindo.


Outro plano

Lêdo Ivo, ledo engano.
Apenas voou pássaro,
e chegou em outro plano.

Maira Garcia

Com fiança

Dignidade que arde.
Que se abre pra quem se abre.

Maira Garcia

sábado, 22 de dezembro de 2012

Samurai que não morre mais

Samurai que não morre mais.
Se confundiu com um haicai.
Se perdeu em três linhas.

Samurai que não morre mais.
Se perdeu com um haicai.
Se encontrou em três linhas.

Samurai que não morre mais.
Me confundiu com um haicai.

Me perdi em três linhas.

Ai, ai, ai.

Maira Garcia

Batuta

Quem te cata-liza, 
é maestro, 
dessa vida.

Maira Garcia

Teodoro de Sampa

Te adoro
 Teodoro de Sampa, 

do Sampaio.
Maira Garcia

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Dizem que seu nome é Sorte

A sorte de te encontrar,
é como a sorte nos pede no susto,
com planos de não fazer planos,
ser feliz a todo custo.

Gostou de seu nome, Sorte.
E te desejou toda sorte.
Te desejou feliz,
por muitos e muitos anos!

Assim sortido,
sorteado
por você,
num semi-breve instante de sua vida.

Amar sem saber no que vai dar,
é coragem e sorte.
A sorte de se encontrar,
foi deixada a própria sorte.

Encontrou agora e falou,
ficou forte, ficou bem.
Agora que falou,
a sorte pode até ir embora, também.

Encontrar a sorte,
fora de hora,
foi bom pra inspirar
e respirar com o melhor porte.

E já falou que foi
por pura,
púrpura
sorte,
que encontrou a sorte?

Sem ter realmente a tal,
foi no recriar,
que aprendeu à deriva,
que amar por amar,
se fazia a sorte escondida.

Agora, a sorte pode ir embora,
não se chora por alguém,
que fez tão bem,
que se deu sorte.

Não vai chorar,
está tudo bem,
não falou, que ficou forte?

Boa sorte, Sorte!
Sem você,
sem te ter,
mas sempre zen,
como tinha que ser,
pra nossa sorte,
que se foi,
e ainda na falta,
deixar o que ficou,
tudo bem.

Boa sorte.

Maira Garcia

Móbiles

Estamos suspensos onde não pensamos,
Aonde não acontece,
Flutuamos.

Maira Garcia

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Sabia?

Aquilo que começa termina,
a vida se encarrega
sábia de verdades,
do melhor jeito,
 sem que possamos impedir,
sem pedir licença,
sem educação,
vem e nos ensina,
sem tempo de chorar ou sorrir,
 nos dando a bença
 da dança,
 a dança que um dia termina.
Sabia?

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Caiu na rede é feixe!

Quem joga indireta na rede, 
pesca um monte de peixes, 
não devolvendo para o mar. 
Quem faz isso com os peixes , 
sabe navegar?

Maira Garcia

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O diploma

Uma carta colocada embaixo da porta, voou na primeira oportunidade pela cidade. Deu algumas voltas, caiu no rio, secou na barragem. 
Quando uma senhora apanhou e abriu o envelope, que já estava seco, concluiu em pensamento:
- A carta já chorou bastante. Não é que ficou um borrado interessante?
Vou guardar comigo, a dor de alguém que já passou.
E olhando pro céu, percebendo a chuva que ia cair, terminou o pensamento.
 - Vou ir embora antes da chuva, não quero perder este papel pra nenhuma enxurrada. Vou enquadrar, amanhã cedo, levo no vidraceiro. Quero lembrar desse dia para sempre, quando olhar pra minha parede!

Maira Garcia

domingo, 16 de dezembro de 2012

Apavora

Se abre num leque,
 na certeza de ganhar atenção. 
Assim meio moleque , nos apavora. 
É o pavão!

Maira Garcia

Pupila Branca que pode ver no escuro


Pupila branca, de se olhar de noite,
diz que vai ver o Sol.
Abre o olho que é a Lua!



Maira Garcia

sábado, 15 de dezembro de 2012

Projeção

Fui ver um filme,
um filme de mim mesma,
no escuro, na plateia
eu juro que vi você,
têmporas, cabelo e gentilezas.

Maira Garcia

Para Planta de Acordar deixar Planta Dorminhoca dormir.

Planta de Acordar,
espero que entenda.
Não é mais para tentar acordar
a Planta Dorminhoca,
por favor, compreenda!
Pois uma estória que não se conta,
por não existir, não se inventa,
e isso tem feito a senhora sua seiva,
se arrebentar por aqui.

Espero que entenda,
a plantinha mandou avisar
que já está que não se aguenta.

Não sei se você sabe,
mas isso de tentar acordar e acordar,
já fez ela chorar acordada.
Então deixe ela dormir sossegada.

Mas será que tem
Planta de Acordar na Mata Atlântica,
 a essa hora acordada?
Tem não! Isso é coisa inventada,
como toda essa questão enluarada!

E assim, o que a sua própria seiva aí pensou,
causou confusão, sem razão nenhuma de ser,
explique de uma vez por  todas,
a não situação, então.

A Planta Dorminhoca quer dormir em paz,
e explica que não gosta de confusão demais.
E se é de brincadeira, e alguém não creditou
ficou sério para alguém, e sério, fora de série ficou.

Transcrevi a carta enviada para o pombo-correio,
que trabalha no lobo frontal, do lado esquerdo do seu alheio,

Sem esquecer do respeito que as
plantas fundamentais nos pedem desde a criação das florestas,
para deixar a poluição mental de lado,
para o ar ficar melhorado.

Maira Garcia

PS: Esta poesia eu fiz inspirada  num(a) leitor(a) assíduo(a) de "Planta Dorminhoca", que nos visita em média uma vez por semana. Não sei de quem se trata, mas a frequência me fez chamá-lo(a) carinhosamente de Planta de Acordar. Algum motivo deve ter e foi assim que a inspiração veio.

Maira Garcia


quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Está espetando.

 Se olhar muito uma agulha,
uma agulha no palheiro,
vira agulha de um palheiro inteiro.

Maira Garcia

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

A lata encantada

A lata de cerveja perfumava o homem,
cujas sacolas aos kilos balançava,
sua meia era de espora,
encardida
de limpar a calçada
da sua sala.

Eu achava que bebia, mas não.
Levava arrastando, em cantos de oração,
as cervejas que você bebe,
fazendo delas,
a sua líquida
refeição.

Maira Garcia

Velozes e furiosos

Os dias correm,
 pra que a gente
 se encontre.

Maira Garcia

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Altar de quem não sabe amar, é fogo!

Queima uma vela pra Afrodite,
enquanto a outra escondida,
vai para o Prometeu,
que ninguém viu onde foi parar.

Maira Garcia

domingo, 9 de dezembro de 2012

Desencana que a vida engana, para Jota Erre.

Quando Jota Erre estava no meio do caminho do céu, um anjo cabeludo com visual parecido com o dele, pediu para ele parar:
-Epa, aonde o senhor pensa que vai?
-Senhor? Com a voz rouca e bem humorada de sempre, aguardou o anjo.
-Eu estou aqui com a sua ficha, e não posso adiantar alguns detalhes anotados em amarelo, que por razões pessoais, serão conversadas depois...
-Pera aí? Vai me dizer que eu não vou poder ir pro lado de lá, meu irmão?
-Esta observação faz parte do nosso treinamento, explicamos isso para todos nessa passagem...
-Vai me dizer... E com a cabeça baixa, pensando na possibilidade de ir para o inferno, onde dizem que a sonzeira rola solta, foi ficando murcho, até que o anjo se aproximou e puxou o locutor para um abraço, dizendo:
-Desencana que a vida engana, Jota Erre! A frase que você inventou e repetiu nas madrugadas do ABC e São Paulo, inspiraram muitos cabeludos, punks, carecas, darks, todas as tribos,tios e tias pelas ondas do rádio. O seu conselho ficou gravado na memória de muita gente e foi acionado em momentos que você não faz ideia! E assim o anjo foi mostrando pra ele como sua frase surgia na cabeça dos ouvintes. Uma rádio apareceu, e nos bastidores que ninguém vê, foi sendo abraçado por várias pessoas, que já tinha perdido a conta. Mas o anjo precisou interromper:
-Vamos Jota Erre, você nem percebeu, chegamos! Tem locução pra fazer e uma banda surpresa pediu para você apresentar o show deles. Pela sua ficha, eu sei que você não curte o som que eles faziam, mas aqui no céu todo mundo é irmão. Conhece os Mamonas Assassinas?


Maira Garcia

Aula de tango

O tango ensina tanto
 a amar
olhando,
por que as pessoas
não aprendem todas de uma
vez a dançar tango?

O tango ensina tanto
a amar
dançando,
por que as pessoas
não aprendem todas de uma
vez a dançar tango?

O tango ensina tanto
a amar
tocando,
por que as pessoas
não aprendem todas de uma
vez a dançar tango?

O tango ensina tanto
a amar de todos os cantos,
por que pessoas como eu,
não aprendem a dançar tango?

Maira Garcia
Para Jaciara, que conheci na sexta, antes do meu café sagrado com o Seu Kamal (que inspirou o conto "A saia da moça da Paraíba"). Ela sabe tudo sobre amor, me deu conselhos, sem saber se eu precisava. Me disse que está preparada para o quinto casório de sua vida, antes de completar 80 anos. Para os interessados, ela vai aos bailes da zona Sul de São Paulo e não adianta ser bom no xaveco, Jaciara é vidente!

sábado, 8 de dezembro de 2012

Bem-te-vi na TV

Hoje perdi um amigo que eu via passar,
aqui de cima, na árvore.
Eu que pensava que ser  Bem-te-vi
podia ser,
morri de estilingada.
Como vivo num desenho animado,
pra quem me vê,
amanhã,
me chacoalho de asas
 e nasço de novo.
Pode olhar,
olha eu lá!
Dá pra ver?
Estou voando pra valer,
depois que foi ligada
a tomada da TV.

Maira Garcia

Imagem de Felipe Pimenta  (Pitangus sulphuratus - bem-te-vi)


quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Nadando de costas

Fazer de conta,
que nada consta,
se é nada o que se conta.

Maira Garcia

Tá na cara

Eu queria ter outra cor,
não por conta do Sol que sempre me queima,
mas do vermelho que sempre me pinta..

Maira Garcia

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Canta pra subir

Cantos, atabaques, fumaça, era chegada a hora tão esperada. Revestiu o corpo de um rapaz mais forte e moreno do que ele, e era o Vinicius de Moraes, e ninguém precisava me falar. Trazia a aura mais clara, e o assustado sinal da cruz que fez dentro do terreiro, não restava dúvidas, veio o poeta no seu feitio mais jovem. Foi me segurando pelas mãos e com o pretexto de acalmá-lo, aproveitei o transe dos demais e pegamos o caminho da rua. E fui puxando seu cavalo, que me acompanhava junto aos movimentos sinuosos do meu salto, até entrarmos no primeiro hotel que encontramos.
O tempo era curto, não sabia quantas horas usaria aquele corpo. Pediu um wiskie na recepção e subimos. Engoliu o comprimido azul que lhe ofereci, sorvendo sem pressa, e sem perguntar a razão.
E começamos a retirar as peças, que iam se esfacelando pela farra dos atritos, ora sincopada, e depois sem ritmo, se esvaindo num aperto desesperado de súplica. E aquela alma dos olhos dormidos, me fez a pergunta:
-É assim que a gente termina? E puxando o ar rasgado, em sufoco, me espera, até eu mudar o enredo.
-É meu caro. Hoje, o infinito é enquanto for duro.
E o poeta se despede, morrendo no meio das minhas pernas, pela segunda vez na vida.

Maira Garcia

Nozes

Não preciso ter você.
Já lhe tenho num lugar,
aonde você não cabe.
Aonde você não sabe.

     Maira Garcia

Amen-doa

Eu peço por você,
como quem doa,
e olha que às vezes dói.

     Maira Garcia

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

É agora que ele quebra tudo.

Hip hop, versos livres, prosa e poesia de muro. 
Só não fazia haicai, mas agora faz, e até no escuro!


Maira Garcia

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Moulage

Ler entrelinhas, costurando,
rente ao corpo, o tecido,
que estava despido.

Maira Garcia


Exame de vista, segundo os olhos de uma fadista.

Se você olhasse o que realmente importa,
o que eu, 
e quem te quer bem,
pode  ver,
você voltaria a ser,
um ser mais bonito.

Pois quando vejo seus olhos,
aqui de longe,
olhos inchados de dor,
que não sei de onde vem,
e nem de qual é a cor,
eu não minto,
é muita dor que eu vejo,
é dor demais que eu sinto.

Maira Garcia

sábado, 1 de dezembro de 2012

Dia 1 de dezembro deveria ser todo dia.

Hoje é o dia mundial de conscientização quanto as formas de prevenção do vírus HIV. Meu TCC na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, foi entregue em 1998, nele eu tentava explicar que o Dr Drauzio Varella mandava muito bem alertando sobre doenças sexualmente transmissíveis, falando como os jovens entendem, usando gírias, em vinhetas colocadas na grade da programação, durante o ano todo,  na rádio 89 FM. Dizia que o doutor falava muito melhor do que víamos nas campanhas institucionais do governo brasileiro da época. Usando gírias, de forma muito criativa, era ouvido pelo público jovem de São Paulo. Apontei neste trabalho de conclusão de curso, através de um levantamento de dados e pesquisas, que as campanhas do governo se expressavam de forma muito vaga para a população, usando a mesma linguagem para falar com todos os públicos, e eram ações feitas apenas perto do carnaval e verão. Passamos por vários governos, e a época de falar sobre prevenção, continua forte apenas nessa época quente. O Dr Dráuzio, durante aquele período, conversava comigo por telefone, pois já era bastante ocupado por diversas atividades junto ao exercício da medicina, bem como as ações de conscientização sobre  HIV. Não demorou muito, e tornou-se um dos maiores comunicadores sobre Saúde e outros temas nesse país, se estabeleceu como escritor e continua atuante, dando seus alertas sobre os comportamentos de risco da população na hora de fazer sexo. Enquanto isso, nós a população, que precisa ser lembrada sempre de se cuidar na hora do bem bão, continuamos, pela parte que toca o governo em nosso sexo, a assistir campanhas de prevenção sobre doenças sexualmente transmissíveis e HIV, apenas quando vem chegando o verão...

Maira Garcia

Cantar como quem ainda reza.

Tinha deixado de ser padre, mas ainda carregava suas orações no peito, e assim que deixou o mosteiro, a primeira cantada que soltou, diante da visão de uma mulher foi:
- Em nome do meu pai, deixa eu fazer um filho com você?


O homem que canta do mesmo
jeito toda mulher é um homem qualquer.

Anda luzes

Sapatearam,
sem sapatos,
até o amanhecer.

Maira Garcia

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Seres que ficarão na retina

Ficam guardados num piscar de olhos,
pois que são feitos de cores de não veremos mais.

Maira Garcia

Inflexibili-dade

O dia que disser mais não
do que sim.
O dia que disser mais sim do que não.
Esse dia envelhecerá pra mim.

Maira Garcia

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Facílimo.

Facílimo.

Gente que é de gostar fácil,
e gente que é fácil de gostar.
E ainda bem que sempre tem!

Maira Garcia

Rendição

Quando me apaixono,
eu não sei o que faço comigo,
Se eu me levo, me entrego, me abandono,
ou me escondo num abrigo.

Maira Garcia

Peito aberto

Eu fiz uma canção que é tua
 que possa te servir como uma camisa,
que não se abotoa.

Maira Garcia

Desinterpretação de texto

É lendo em desconcerto
que uma hora eu acerto,
mas que ninguém esteja por perto.

Maira Garcia

Que Deus me perdoe a sinceridade dessa vez!


Hoje tive a ajuda de dois anjos e um capeta,
e que Deus me perdoe,
pois eu adorei a ajuda dos três!

Maira Garcia

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Os vizinhos reclamando do barulho.

Escrito em Ata da Reunião do Edifício Tapajós, há exatos 15 minutos.

Na reunião com o síndico Dilermando, do Edificio Tapajós, é chegada a hora das reclamações. A Dona Tereza do 303 ficou sem dormir, o motivo foi Seu Antonio do 304, que deu para jogar tranca na varanda com a Vânia do 305. Todos moradores dos apartamentos de número quatrocentos, querem mandar para os quintos, o casal de recém-casados do 503.
Não sabem nome deles, mas reclamam que estão sapateando sem sapato até o momento, fato confirmado no instante que Seu Dilermando pediu que todos gentilmente fizessem silêncio.

  Maira Garcia


domingo, 25 de novembro de 2012

Subli-mar

É tão sublime, sublimar,
mesmo que seja na marra,
em nome do criar.

Maira Garcia

O Natal da Sé que ninguém quer ver.

A praça mais linda que já vi nessa cidade, perde apenas para as cores e adornos do Natal da Avenida Paulista, protegida com mais gente, família e polícia. A Praça da Sé, já foi de outros capitais, continua e sempre será da Catedral, mas sofre pela pouca fé de nossos antigos e atuais barões. Tirando o que precisa ser visto e agasalhado na praça, do simples ao imperial de suas Palmeiras que torcem pela vida que ali resiste, elas, as Palmeiras, estão vestidas de pisca-pisca amarelo, que não piscam, fazendo do menos seu mais. 
A Praça da Sé no Natal, se apresenta com uma passarela digna de São Paulo Fashion Week e quem quiser ver, antes das nove horas da noite, quando é mais seguro, não vai se arrepender ao enxergar sua simplicidade luminosa. Após esse horário, evitado por muitos, mulheres são iluminadas para circular em sua honrosa e necessária função, observadas cada qual com seu cafetão, concorrendo com as novas Amys sem house, que estão lá pelas pedras que não são de Swarovski porque poderão morrer antes de chegar na 25 de março. As meninas, que valem muito mais que qualquer ouro de tolo, na madrugada, perambulam perto da Rua do Ouro, estão lá para evitar que seus amores vampiros não roubem o tesouro escondido de quem passa correndo, piscando pela praça da Sé, nas primeiras horas da manhã.


Maira Garcia


Deixa eu acreditar por você.

Deixa que eu acredito por você.
Pois quando vejo os olhos seus,
vejo Deus aonde você não vê.

Maira Garcia

sábado, 24 de novembro de 2012

Despacho grátis

Conforme o enunciado, trazemos de volta seu amor,
em alguns dias, com trabalho pesado de poesia.
A entrega é por nossa conta!

Maira Garcia

Há muito tempo.

Há muito tempo,
que o fim do mundo é pretexto.

Maira Garcia

Amigo invisível

-Mãe, lembra aquele amigo invisível que eu via?
-Lembro.
-Ele acabou de se despedir da gente!
-E o que ele te disse dessa vez?
-Que não era pra eu ficar triste de jeito nenhum!
-Como assim?
-Explicou que amigos de verdade nunca vão embora!
-Vem cá! Trazendo a criança junto ao peito, num abraço apertado, antes de perguntar
pela última vez sobre o assunto.
-Você ficou triste?
-Não, mãe. Dessa vez eu acreditei nele!

Maira Garcia

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Caminhão de mudança

Um espelho foi carregado junto,
e durante a mudança,
virou o mundo.


Maira Garcia

Aqui o bicho também está pegando.

Uma andorinha se viu sozinha quando sobrevoava perto da Fundação Casa, no Brás, em São Paulo.
Não conseguiu entrar lá por causa das grades. A situação complicou pois uma sozinha não faz verão mesmo, porque a cidade está repleta de pombas e pardais, cujo território é marcado por força de artilharia pesada de digestão. A saída foi fazer um rasante no metrô, e foi lá que a pequeninha seguiu arrasando e embicando, a especialidade desastrosa da espécie mais cheia de bossa.
Conseguiu entrar em pleno horário do rush, precisou de coragem, mas não demorou muito e começou a falhar o motor no meio da paisagem humana. A primeira embicada foi numa senhora que gritou no aperto dos caminhantes:
 -Morcego! Que horror!
E começou a gritaria com tumulto. O coração da bichinha não estava segurando, e num impulso de poucos metros, seguiu o caminho da estação, e em menos de 30 segundos, entrou numa sacola, bateu num boné de dois que se beijavam e quando pensou que tinha chegado a hora derradeira, avistou aquilo que parecia impossível para seus olhinhos esmagados e apreensivos.
Encontrou na miopia da aflição, uma planta de alguém seguindo o fluxo do trem, e pensou:
- Agora me finjo de morta e assim que essa planta para de andar, eu escapo antes que o trem abra a porta!
Quando deu por si, as asinhas estavam quebradas e pensou:
 -É o fim da linha pra mim! Como eu vou sair daqui?
Pediu ajuda pro céu que ela sempre voa, mas a mão do santo que chegou foi diferente do pedido.
Um rapaz cheio da paciência no trajeto, um dos poucos que dizia com licença, por favor, espera um pouco, na pressão e calor do aperto, foi abordado por uma criança que estava com a mãe segurada no colo:
- Mãe, é o Batmam no cabelo dele? A mãe nem quis ver, mas o rapaz agradeceu o menino:
- Obrigado! E foi puxando as duas tranças de um metro e vinte, aonde o menino viu seu herói pendurado.
Era a andorinha e seus olhinhos esprimidinhos, em ponto de cruz, pedindo pelo céu se fingindo de estátua.
E o moço concluiu:
 -Foi Djá que trouxe você, pequenina!
O menino completou:
-Foi Deus quem trouxe o Batman, mãe? A mãe quando viu o tamanho da trança, puxou a criança para o outro lado e nem confiança.
E o rapaz da trança respondeu ao despedir-se do menino:
-Sim, acho que foi Deus que trouxe a andorinha!
E a ave foi com ele, protegida pela bolsa e a bandeira da Jamaica até o bairro de Guaianazes.
Ficou uma semana tratada com regalias de um rastafari e acabou indo embora, em cima da hora no verão.
Depois realizou um voo tranquilo até Pirituba, onde muito viva seguiu para cidade de Campinas, porque em Sampa, sem turma grande para voar em bando, percebeu que o bicho realmente está pegando.

Maira Garcia        

 Foto tirada com meu celular, na plataforma aonde esta estória acontece.

A maior tragédia que pode existir

A maior tragédia que pode existir,
é achar que tudo que se passa no mundo, 
que tudo, que tudo, 
foi feito pra si.
Sendo assim,
a maior tragédia que pode existir,
é o se, é o se, é o se.

A maior tragédia que pode existir,
é não existir para si.
É poder ouvir e não ouvir,
é ter olhos e negar a visão,
sentimentos e negar o toque,
é ter mente e não ter coração.
Sendo assim,
a maior tragédia que pode existir,
é não saber
o existir do mundo,
do outro mundo,
do mundo do outro e de si.
Sendo assim,
a maior tragédia que pode existir,
é o si, é o si é o si.


Maira Garcia

Dedicado aos grupos Payasos sin Fronteras, Pallasos en Rebeldía e todos os palhaços do mundo que trabalham trazendo alegria onde nenhum outro meio alcançaria.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

A cara no poste

Pode ser até um cartaz colado num poste,
estampando uma cara de sorriso,
pedindo um abraço apertado dos amigos.


Zumbi para os que ainda dormem.

Salve Zumbi, Ganga Zumba e todos que vieram antes e depois.
E os que ainda dormem,
por favor, acordem!

Maira Garcia

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

A sua visita.

As palavras te levaram pra passear,
que a poesia faça você voltar.

Maira Garcia

Dedicado ao escritor Paulo Rodrigues.

Era uma vez um lugar vazio.

Eis que um dia,
todos os espaços foram devidamente preenchidos,
e foi aí que finalmente conseguiram descobrir
aonde morava o perigo.

Maira Garcia

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Olhar que não arranca pedaço.

E foi de olhar que passou a observá-lo.
E foi de observar, 
que passou a farejá-lo.

E foi pelo cheiro que descobriu que ele tinha um par,
que não era de vaso.
Descobriu que o par dele, era exatamente como ele precisava,
não pelo porte, 
ou pelo pelo, 
mas pelo olhar.
Descobriu que ele era mais frágil, 
não pelo tamanho e
que precisava dela pra todo passear.

Foi um dia desses, na calçada, 
que conheceu a mãe dele,
que também era mais forte que ele.
Se alguém puder explicar este passeio,
quem sabe colocando o tal do Freud no meio?
Mas será que o Freud entende de cão?
Porque ela, a de tanto farejar
que desistiu até de olhar
por descobrir o par,
é vira-lata, 
o par dele, uma cocker, 
e ele, inexplicavelmente,
um baita de um pastor alemão!

Maira Garcia

A charge

Uma alegria ou uma tristeza imensa,
mas o que seria de nós
sem uma charge pra mostrar
como o mundo é besta?

Penas da natureza

Que as mães e os pais corujas,
fiquem apenas na natureza,
que as mães e os pais corujas daqui,
estão nos enchendo de penas.

Maira Garcia

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Pra nos encher de coragem

Amizade é o que temos de mais precioso,
e de graça nos enche de coragem,
faz perceber de um jeito prático
e despretensioso
como perdemos tempo
com bobagens!

Maira Garcia

domingo, 11 de novembro de 2012

Entretelas

Atravessar o dia,
chegar tarde,
entreter a noite.

Maira Garcia


Versos livres versos

Versos que são livres versos,
que são lidos,
livremente
no universo.

Favor deixar
versos soltos.

São versos,
sãos seres,
por serem versos
livres
em seus dizeres.

livres versos,
versos livres,
versos livres de viver,
que são os versos,
universos
de todo ser.

Maira Garcia

sábado, 10 de novembro de 2012

Sauda-ção

Dias bons,
são recibos de um dia que passou,
pra servir quem quer
receber novamente:
- Bom dia!

Maira Garcia

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

A chegada e a partida de Clara.


A galinha chegou pelas mãos do chacreiro Seu Venâncio, no dia que o rádio e a televisão anunciaram o falecimento da cantora Clara Nunes. Não demorou para ser chamada de Clara, fora do galinheiro, é claro. E pelo dia de luto que veio, ficou decidido que não morreria como as outras. Seu destino não seria a panela. Depois de muito acordar e dormir, cacarejar, botar ovos, ver o nascimento e a partida de muitos galos e galinhas, o dia mais claro da Clara chegou. Seu Venâncio, percebendo o peso dos olhos da galinha e o fôlego sacolejado que se desalinhava a cada suspiro, abriu o galinheiro para Clara partir. Para as crianças menos crescidas, explicou que a Clara, que era muito aparecida, ia desaparecer na estrada. Tinha namorado, casado, virado mãe, avó e bisa e caprichado muito no feitio de seus ovos saborosos e que não achava direito que dormisse para todo sempre por ali. As crianças acenaram para Clara, que já não via mais nada. Para homenageá-la, a mulher do chacreiro, Dona Lucinda, colocou para tocar na vitrola um disco pra ir repetindo uma canção cheia de esperança, chamada "Minha Partida", na voz de Clara Nunes. E Clara sumia, ensaiando pra quem via, uma dança curiosa, do pouco equilíbrio, do desenho de suas marcas deixadas no caminho. E lá se foi  na calçada de terra, toda cambaleada, sumindo pra dormir para sempre na mata. Foi se despedindo, sentindo o respeito das promessas que o bicho homem às vezes faz e às vezes cumpre, a galinha foi marcando um ritmado desassossego, de meio fiozinho, um quicado que dava o rumo da sua nova morada. E foi numa chácara, numa beira de estrada do Brasil, que um povo a seu modo, inventou um jeito de deixar claro a saudade de um cantar, não deixando levar pra panela, uma galinha, batizada com o nome de Clara.

Maira Garcia

Lente de água

aguado,
o mundo muda de tamanho,
sem querer.

Maira Garcia

Vamos dar nome aos pássaros?

Vamos dar nome aos pássaros?
Pois os bois, não tem jeito,
já foram marcados.

Maira Garcia

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Rebento

O Pedro estava mais inquieto que de costume. Jacira, a empregada, depois dos cortes de despesa da casa, acumulava a função de babá e diarista e ainda por cima estava grávida de quatro meses. Estava difícil passar a roupa pois a cada cinco minutos precisava parar e atender o chamado do menino que ainda não completara  cinco anos.
Dessa vez, o Pedro quis lhe fazer uma pergunta:
-Eu preciso descobrir como funciona isso, Jacira.
-Que foi, Pedro?
O Pedro olhava sério para barriga da Jacira. O menino colocou  a mochila na frente da barriga e abrindo o zíper, colocou um livro dentro.
- E agora, Jacira?
-Desembucha, Pedro! Eu tenho uma pilha de roupas pra passar e você não está deixando!
- Jacira, olhe!
Colocando as mãos na mochila que levava na frente, imitando o jeito que Jacira segurava a barriga, disparou:
- Acabo de descobrir que minha mochila está grávida de um livro!

Por escrito

Carregava a bolsa na frente. Somado o volume do peito, agora levava
 suas dores nas costas.
A mochila que guardava cadernos e livros, era toda rabiscada com um
nome escrito com caneta em tinta azul. Quando a bolsa estourou, o bebê
que ali se escondia, ganhou o nome que a mochila trazia. Pedro.


Detido

Dia duro de furto. Antes de sair do centro, teria que usar seus sete dedos para realizar o feito. Não conseguira nada até então. Havia tumulto e aperto, perto do metrô, parecia perfeito. Uma dona distraída, que levava sua mochila vacilada, nas costas, olhava as fofocas da revista numa banca da Praça da Sé. O moço tentou fazer de conta que também via e le
vou sua carteira, bastando roçar e dedilhar, raspando o zíper. A mulher desceu as escadas indo para estação. Escondido e satisfeito, abriu a carteira, viu o que queria, mas voltou atrás com a cabeça, correu pela mulher. Correndo e agora de encontro, descendo escadas.
A mulher procurando a carteira pelo bilhete, antes da catraca, deu por falta e entrando em desespero ia na direção do guarda.
O rapaz chegou pouca coisa antes.
-Senhora, deixou cair sua carteira! Respiração curta e olhos assaltados.
-Deus te abençoe, moço! Segurando firme suas mãos, quase que beijando, em sofreguidão.
-Sou eu mãe, o Mariano, não me reconhece?
-Mariano, por onde esteve, se passaram quase dez anos! Tocando o rosto de um homem que um dia foi feito, agora procurando tatear a verdade em suas digitais.
Vozes da estação, multidão de dois, alguns anos na prisão, noites sem dormir, a eterna busca. A mãe não segurou a mão, o abraço com a mochila nas costas terminou em desmaio, mas não caiu. Dessa vez, foi o filho quem segurou. Embarcariam em algumas horas, em dois dias estarão na casa de mainha, em Feira de Santana, na Bahia.


Maira Garcia

Cruzamento

A mochila caiu em frente da Praça Ramos de Azevedo. Um pegou um braço, o outro pegou outro. Estavam devidamente abraçados. Dançaram tango, floreado e xaxado ao som do camelô que gritava antes de passar o rapa. Foram aplaudidos e filmados. Moedas no vestido, colhidas mais tarde, perto do umbigo.

Maira Garcia

Trilogia da mochila

Arrebento

Ia arrebentando a mochila, a garrafa de água molhou papéis e documentos.
A correria foi intensa até chegar no prédio central.
Arrebentou dentro da biblioteca.
Dois exemplares foram salvos e agora passam bem.

Detento

Dia duro para um furto. Antes de sair do centro teria que usar seus sete dedos para realizar o feito, não conseguira nada até então. Havia tumulto e aperto, perto do metrô, parecia perfeito. Uma dona distraída que levava mochila nas costas, olhava as fofocas da revista numa banca da Praça da Sé. O moço tentou fazer de conta que também via e levou sua carteira, bastando roçar e dedilhar delicadamente o zíper. A mulher desceu as escadas indo para estação. Escondido e satisfeito abriu a carteira. Voltou atrás com a cabeça, correu pela mulher. Correndo e agora de encontro em ponto de bala, descendo escadas.
A mulher procurando a carteira pelo bilhete, antes da catraca, deu por falta e entrando em desespero ia pedir ajuda para o guarda. O rapaz chegou pouca coisa antes.
-Senhora, deixou cair sua carteira! Respiração curta e olhos assaltados.
-Deus te abençoe, moço! Segurando firme suas mãos, quase que beijando, em sofreguidão.
-Sou eu mãe, o Mariano, não me reconhece?
-Mariano, por onde esteve, se passaram quase dez anos! Tocando o rosto de um homem  que um dia foi feito, agora procurando tatear a verdade.
Vozes da estação, multidão de dois, alguns anos depois da prisão, noites sem dormir, a eterna busca. A mãe não segurou a mão, o abraço com a mochila nas costas terminaram em desmaio, mas não caiu no chão. O filho foi quem segurou a razão.  Embarcariam em algumas horas, em dois dias estarão na casa de mainha, em Feira de Santana, na Bahia.

Cruzamento

A mochila caiu em frente da Praça Ramos de Azevedo. Um pegou um braço, o outro pegou outro. Estavam devidamente abraçados. Dançaram tango, floreado e xaxado ao som do camelô que gritava antes de passar o rapa. Foram aplaudidos e filmados. Moedas no vestido, colhidas mais tarde, perto do umbigo.

Maira Garcia


quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Identidade

Não se sabe seu nome,
mas
revira o lixo,
nem tem como negar.
Tem alguém ali.
Que ainda está.

Com fome.

maira garcia

Uso minha licença poética porque não sou jornalista para falar de Mia Couto.

E o Mia Couto fez a Mona Dorf se emocionar ao ponto de quase embargar aquela voz segura que costumamos ouvir, ontem no Cinema da Livraria Cultura. 
"Como escrever algo com uma alma tão feminina, me explica?"
Após ler a introdução de um de seus livros. A mulher que vive na África como um todo, e em Moçambique é enorme, mítica e soberana, mas vive sobre uma violência, se é magnífica, é considerada bruxa, e sendo exuberante por si só é castigada. Os homens ali tem medo delas e respondem com vingança e violência, e aí consiste a mulher que precisa existir e vou de encontro a ela, transcrevo com minhas palavras um breve resumo. Tivemos o Mia lendo trechos de "A confissão da leoa", ao nos contar a partir de um fato real sua Moçambique inventada, como ele sempre diz. "Há muitos sítios ali que não existem, não adianta procurar no mapa!". E quando afirma que "as perguntas são mais cheias que as respostas" e "gostaria de mais luz aqui, esta penumbra confere ao local um certo ar de clandestinidade, e eu gostaria muito de ver vocês", fez valer a pena ter ido lá para ouvir o que o sertão de João Guimarães Rosa nos trouxe de volta pelo mar. Com a pele rosa, olhos azuis de fogo, alma negra e mestiça, Mia Couto.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Sinto muito

Duas palavras que resolvem questões
em menos de 10 segundos.
- Sinto muito.

Maira Garcia

Folhas vivas

Vez ou outra, a folha vem e toca alguém.
Dizem que não respiram sem a árvore,
mas voam vivas em folha.

Maira Garcia


domingo, 4 de novembro de 2012

sábado, 3 de novembro de 2012

Um quarto de horas.

Corpos se derretiam em colheres de
variados sorvetes,
e no calor dos tecidos,
dos exercícios,
iam se imprimindo
 de cores fortes nas paredes.
 Tantas e tantas vezes,
que um afresco quente
foi surgindo num painel
daquele quarto de horas.
Eis que um dia,
a solidão dos famintos,
 atravessou em carimbo,
o outro lado da parede.
No alto do prédio,
podia-se ver
um desenho de um avolumado
sentimento sem nexo.
Gravado na memória
de tanto açoite,
de tanto sexo.

Maira Garcia

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Açaí de assanha

Açaí borrou na boca,
virou batom,
bateu uma sede tamanha,
e ninguém mais sabe a cor
que ficou.

Maira Garcia



terça-feira, 30 de outubro de 2012

Poetas não se morrem mais

Poetas,
vivem de todas as formas
e formas que se tem notícia.
Poetas fingem morrer
para viver
nas juntas,
nas canelas,
na corredeira
de sua gente lista
 e fictícia.
Poetas não se morrem mais,
poetas não mentem.
Poetas não se morrem mais,
como antigamente.
Poetas não se morrem mais,
para viver de contar
o que corta o mundo
de hoje e de aurora
e
o que vem pela frente.

Agora é festa,
pois poetas,
não se morrem mais,
como antigamente.
Vivem de seu papel,
aqui e no céu,
para que todos amem sua gente,
para todo sempre,
e que todos se amem
nos finalmentes,
também.
Pois poetas não se morrem mais
como antigamente.

Maira Garcia

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Quando entendem o que se quer entender.

Ninguém entende o que você fala, 
está sendo incompreendido
neste mundão?
Não fique parado, musculando, 
faça algo de concreto. 
Esta canção do Toquinho e Vinícius
é um desabafo dos tempos de outrora. 
Mas quem disse que não somos auditados
e mal versados diante de tantos olhos, 
nos dias de hoje, em novas dita-duras?
A maldade quer ser mais forte?
Cante esta canção que está em italiano, 
que é pro xingamento
e desabafo ficar escondido,
mais leve, 
meio que esboçando um sorriso.
Que é para ver se o riso quebra a vontade de não entender.
É gente querendo brigar sem motivo
por não ouvir o que você quis dizer,
ao sonhar?
Versar de viver, pelo livre pensar?
Vai!
Por favor, cante comigo!
A gente ainda se encontra para tomar um café,
e vamos falar de Toquinho e Vinícius.

Maira Garcia

domingo, 28 de outubro de 2012

Abençoadas que são, suas mãos.

Abençoadas as palavras que são suas,
que suam mãos que procuram versos.
Abençoadas as palavras que são dela,
que de tão belas,
tocam frente e verso
suas mãos.

Maira Garcia


sábado, 27 de outubro de 2012

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Falando a verdade consigo.

Um homem que resmungava num banco do parque Trianon,
na avenida Paulista, chamou a atenção da moça ao lado,
quando concluía em voz alta, gesticulando, olhando pro nada.
-Você pode continuar falando, sabe que eu te ouço, não sabe?
E espero que não fique chateado comigo, com o que eu vou falar,
pois eu há muito, muito te estimo.
Foi de tanto querer puxar assunto com você, sem me responder,
que eu comecei a falar sozinho.

 Maira Garcia

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

As crianças do Largo de São Bento

Eu vi umas dez crianças correndo e já era noite,
no largo de São Bento.
Risos, escondes, bolas, piques e não moravam longe.
Vinham de um prédio invadido aonde famílias lutam por espaço e abrigo.
Olhei pra Lua que também olhava comigo,
cheia de vivas,
na madrugada,
correndo,
cheia de vivas e escadas.
Lua e nuvem,
bola de risos,
anjos,
de água benta,
escorrendo
sem nenhum medo,
bem perto da igreja,
sem segredo,
cheia de vivas,
vão entre as escadas,
de se esconder,
correndo do perigo,
que só vendo mesmo.

Maira Garcia

Lumiar

Ele veio apenas trocar uma lâmpada, nove meses depois chegou o iluminado.

Maira Garcia

Estetoscópio

Ouvir o coração um do outro,
nos faz
do mesmo tamanho,
um pouco,
um pouco,
um pouco.

Maira Garcia

domingo, 21 de outubro de 2012

sábado, 20 de outubro de 2012

Guidão

Vergonha que nem todo mundo sente,
é uma pena se não sente.
Vergonha na medida,
 muda
 a direção e a vida
de muita gente.

Maira Garcia

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Não ganhar na loteria e estar feliz da vida.

Sem notícias para chegar,
 do nada acontecer.
O Sol quer antes dele seu acordar,
uma vez que o galo já cantou,
nada mais vai doer.

Maira Garcia

Eu-foria.

A sorte de ganhar,
a mesma sorte de perder a mesma sorte.

Maira Garcia

O sumo, o bagaço e a vinha

A realidade é melhor que o vinho
 do tempo
 e a safra.
Razão pela qual
 eu tomo sempre
 suco de uva,
até o sumo, visse?

sábado, 13 de outubro de 2012

Amizade de papel bem passado.

Bonecos de papel, desses que têm roupinha e tudo, que ainda se pode encontrar em alguma banca de jornal descolada da cidade, resolveram passear escondidos de seus donos, sem saber que iriam se conhecer naquele dia. E foram se encontrar ao acaso, num sebo onde podiam comprar livros de poesias feitas por outros bonecos que também tinham seu papel no mundo.
Mas só encontraram um exemplar, de uma única edição, e pegaram juntos. Não houve briga, apenas uma leve discussão, pois sem a delicadeza adequada podiam rasgar a mão.
Racharam a conta e ficou rascunhado que se visitariam em suas casas para pegar o livro um do outro, sempre que a vontade viesse, e sem que seus donos soubessem.
E foram ganhando aquele pretexto das conversas que nos fazem virar amigos de verdade, em papel bem passado.
Até que uma noite, que bonecos não esperam, assim como nós, e principalmente quem gosta de ter bonecos de papel e não se pode imaginar, uma tempestade inundou toda cidade e eles se desmancharam, virando bolinhas de papel machê esparramados pelo chão.
Mas foi numa tarde alaranjada, com início de noite bem azul, que as almas inquietas dos bonecos voaram juntas e estacionaram cada uma, nos ouvidos de um homem que comprava uma raridade de bonecos de papel, justamente naquele sebo, que eles se conheceram.
Imediatamente, aquilo que foi embora na água ficou sólido na cabeça daquele que faria os dois renascerem para todo mundo ver, em várias páginas e línguas, num roteiro cheio de gramatura.
E o homem feito de carne e sentimento muito apurado, passou os dois num sulfite para virar filme de película, que também poderá ser visto em cópia digital, para salvação e seguro em caso de incêndios e enchentes.
Quem assistir ao filme, que poderá entrar em cartaz não se sabe quando, vai sentir na pele a amizade provocada por um livro e a poesia que é desmanchar e sobreviver, mesmo depois de um dilúvio.

Maira Garcia

braço de rã

braçando,
voando,
vou meio rã.

maira garcia

A pia mente

Acreditava piamente que falava comigo,
olhei no espelho lavei as mãos,
enxuguei com a toalha,
como a gente se engana quando não quer encarar?
Tornei a olhar pro espelho,
torneira,
pia e espelho,
debrucei a molhaceira,
piamente,
a pia mente.
Não é que mente mesmo?
Vi o escoar, tentei o enxugar
para aquilo que pia pedia a saída é molhar.
O pior é ter o espelho
que afirma.
Lavei as mãos.
Olhei pra pia, olhei pra baixo,
olhei pros lados, olhei pra cima, evitando o espelho em frente.
Não é que a pia mente?
Me deitei na cama, e é a cama que ajuda a pensar.
Da próxima vez que achar
que ainda me chama,
 vou lembrar
 da pia
a escoar pelo ralo
o dizer que me ama.

Maira Garcia

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Leite da castanha

E o leite já ia secar,
lembrou das preces
das bandas de lá.
E o peito correu pra Pará,
com os pés que foram dançar.
Caju virou leite,
Beiju virou azeite,
Até que a tristeza rezou,
foi pro baile,
bailou com vontade e
virou enfeite.

maira garcia

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Pare o carro agora, ou cale-se para sempre.

O rapaz viu a noiva que não era dele, paixão à primeira pista,
que ia correndo pro altar, mas já era tarde, pelo andar da carruagem,
que  indicava que o nunca mais belo da sua vida,
não refletiria mais no seu andor.
Sem saber o que fazer, apelou, levou multa, quase bate-e-volta,
e o carro do casamento fechou.
A noiva saiu pela porta esbaforida, rímel nem mais se vendo,
ele enrasgou no véu, puxou pela mão, pediu pela mãe do céu e brecou:
-É tanto corre, é tanto juramento!
Deixa eu me casar no seu casamento?

Maira Garcia
Foto tirada com celular, na sorte do dia 23/01/2013.
Nunca tinha visto pintura de faixa e sinalização de trânsito!

Me ensina

Não me provoque
Não me assanhe
Me ensina.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

A corda

Alguém disse que me ama em verso e em corda.
Por favor, não me acorda!
Suas mãos puxam meus cabelos em sonhos.
Não percebo em que notas.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Reflorescer rosa vermelha

No vaso, da terra revolvida,
 depois da poda,
jogaram água
e o sangue voltou a correr
aonde era cor-de-rosa.

Maira Garcia

sábado, 6 de outubro de 2012

Esses baianos que moraram aonde eu nasci

Eles moraram aonde eu nasci, 
fazendo música dos ares de lá, 
no Sítio do Francês que dirigia avião de verdade,
 perto da Rodovia Índio Tibiriçá, 
quem veio antes pode cantar.


Por Maira Garcia  e  um pedaço da música que virá.

De ouro

Adoro-te,
douro-te,
e me faço uma joia de você.
Joia de escravidão,
quero não.
Escolhi da libertação,
aquela que as pulseiras se abrem,
douram o céu de janeiro até dezembro,
no hemisfério azul.
Joia do eu me lembro,
joia de doação.
Indo guardada na caixa dos abraços,
sem remetente.
Está chegando sem laços, aberta,
coberta de coração.

Um dia, sem joia, sem lira,
a gente se vê.

Maira Garcia


quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Meia saudade

Já fiquei esperando num lugar
aonde tinha certeza que viria.
E você não veio nesse dia.

Até que de tanto querer
você veio.
Veio um meio você,
de tanto medo de mim,
que veio pela metade me ver.

Um sentado me sorria
 de soslaio, enquanto
o outro corria e
segurava os braços
ao contrário.

E a vontade que eu não sei se eu tenho,
 é um desejo e meio.
Desejo de abraço,
não sei se de beijo.

Parece bonito demais
e fala bonito demais.
E que está sempre certo,
quando diz que eu não sei
o que eu quero.

Quando apenas um querer eu tenho.
Abraçar você bonito demais,
pra falar bonito demais,
porque meu braço
quer descansar de esperar,
a sua outra metade chegar.
E conhecer você de verdade.
E um dia ser, saudade
inteira de saudade.

Maira Garcia